terça-feira, 18 de julho de 2023

Gosto se Discute, ou Não?

Volta e meia nos deparamos com situações que não estão previstas em cursos e manuais, que não são usuais e cotidianas. Essas circunstâncias, para as quais não temos macetes e posturas pré-estabelecidas nos colocam em uma situação na qual temos que decidir de forma ponderada, muitas das vezes sem a devida experiência e vivência para se ter uma segurança, uma firmeza sobre o que será decidido. 

Para momentos como estes, o senso comum, ou a forma convencional compartilhada pela maioria de uma sociedade, costumeiramente apresenta a solução a qual chamamos de "Bom Senso". Esta é uma sentença irmã da sentença do "Bom Gosto".

A verdade é que tanto o gosto, quanto o senso podem e variam de indivíduo para indivíduo e são diferentes em diferentes locais, em diferentes tempos e mesmo em diferentes grupos, de forma que é até mesmo complexo classificá-lo de forma qualitativa. 

A tomada de decisão baseada no senso pode levar diversas variáveis em consideração, aumentando a complexidade da reflexão do indivíduo. O equilíbrio, a sensatez, a razoabilidade são qualidades adquiridas com o tempo e podem sofrer alterações qualitativas à medida que o ambiente é alterado. 

Um exemplo claro é relativo a investimento em propaganda e escolha de mídia. Em qual momento, exatamente, o mais prudente deixou de ser investir em propaganda em um jornal impresso de grande circulação e passou a ser investir no portal de notícias da mesma empresa?

Essa noção de bom senso não é universal, nem ao longo do tempo e nem do espaço. Dessa forma, envolve um conjunto amplo e complexo de variáveis que são afetadas pelo ambiente, pelo histórico do indivíduo e por suas paixões. 

Outra questão envolvendo o senso é em relação à resposta do outro. O cerne do senso, em muitos casos seria exatamente este. Assim, a noção de senso se torna ainda mais complicada, já que devo entender o outro para considerar como boa ou má a minha atitude. 

Embora possa parecer óbvia em muitos casos, a decisão baseada no senso pode ser muito mais complicada à medida que o individualismo permite uma diferenciação ampla nas atitudes e nas recepções dos outros em relação ao comportamento de um indivíduo. 

A arte abstrata é uma prova da variação de aceitação individual no que diz respeito ao gosto!



Porém, o senso ainda busca seguir o estabelecido pela lógica. Mais complexo é o gosto. E é exatamente ele, o gosto que torna ainda mais complexa a análise do senso.

Existe, obviamente o gosto natural do ser humano, como existe  gosto comum, que é compartilhado pelos indivíduos. Existe também o gosto que ajuda a sociedade a prosperar e a continuar existindo, o que poderíamos considerar como o gosto ideal. E não podemos ignorar o gosto diferente e o gosto contraproducente.

O gosto comum, podemos classificar como padrão, aquele que é compartilhado pela sociedade, que é culturalmente aceito. Como o gosto do brasileiro pelo futebol. Existem brasileiros que não gostam de futebol, o que é normal, comum. Porém não é o padrão. O que não chega a poder classificar como um mau gosto. 

Podemos classificar um outro grupo de gosto como o Ético, ou aquele que promove o bem-estar para uma comunidade, ou ajuda a sociedade a progredir ou se manter viva. Este seria o ideal e se aproximaria a ser considerado, de fato o "Bom Gosto". Como exemplo para o "Gosto Ético" podemos citar o prazer em ajudar os outros, ou em fazer trabalhos voluntários ou até em jogar o lixo na lixeira. 

Na outra ponta, estaria o "Mau Gosto" , no qual poderíamos classificar aquilo que é do gosto de alguém, mas que prejudica a sociedade, como o gosto de ver outros sofrerem, o gosto por sujar as ruas, etc. 

De forma bem clara, podemos ver que existe a possibilidade de classificar um gosto como "Bom" e outro como "Mau". Porém, essa classificação em nada deve obedecer a padrões estéticos. Estes são individualizáveis e devem obedecer aos anseios do próprio indivíduo ou do grupo. 

A questão meramente estética se afasta da ética e se aproxima do padrão. Aqui, devemos também considerar a influência de classes dominantes e suas imposições estéticas. Assim, não há plausibilidade em classificar qualitativamente a estética, que varia em relação ao espaço e ao tempo. 

Se na África estampas coloridas satisfazem as tribos, no Japão roupas brancas nada chamativas são as preferidas. Não há melhor ou pior, nesse caso! São apenas tradições culturais que influenciam os gostos da comunidade e esses gostos sofrem considerável resistência a mudanças em termos coletivos, ainda que, individualmente possam oferecer a possibilidade ao indivíduo de fugir dos padrões sociais impostos. 




Por outro lado, questões com base na ética podem gerar mensurabilidade qualitativa. Desse modo, nesse ponto podemos falar em "Bom" e "Mau" gosto. Entendemos que isso não tem diretamente a ver com a moral, a qual é mãe do padrão e não da ética. 

Ao contrário da ética, a moral pode escamotear a imposição elitista e assumir a função muito mais estética do que ética (e muitas vezes assim procede).

Portanto, o conceito de "Bom" e "Mau" gosto devem ser norteados pela ética que cercam o gosto em si e não pela moral ou pela estética, uma vez que ambas costumam estar associadas. Se o "Mau" gosto pode ser identificado, por exemplo, em uma piada que agride e ofende gratuitamente um indivíduo ou um grupo (o que é notoriamente antiético) por outro, o "Bom" gosto deve ser o seu contrário (ou o que é ético) e não o similar ao gostar do mais caro, o que seria moral e baseado em uma estética de uma elite, que pode ser imposta por razões sociais e econômicas. 

Por fim, vamos encerrar com a afirmação de que o Bom Gosto é o gosto que atende às diretrizes éticas, enquanto o Mau Gosto é aquele que as agride. 

Alípio de Araújo Neto.

Nenhum comentário:

Postar um comentário