sexta-feira, 9 de agosto de 2024

A Elite [#Parte 1] A Desigualdade

As diferenças são características imanentes em todas as espécies, por mais que pareçam não existir, em alguns casos. Mesmos populações de seres unicelulares possuem algum grau de diferenciação entre seus indivíduos.

E é exatamente essa diferenciação individual que permite a evolução da espécie, conforme afirma Charles Darwin. As diferenças genotípicas propiciam a possibilidade de adaptação a novos ambientes, possibilitando a sobrevivência da espécie. 

Essa diferenciação é inseparável da natureza da vida e, por ela temos tanta riqueza biológica, em nosso planeta e, acredito que seja bom que isso aconteça. Não podemos imaginar a falta da diferença em populações de espécies, sejam animais, vegetais, fungos, bactérias e outros seres considerados vivos. 

A natureza estipula essa diferença e ela é, de certo modo responsável pela evolução das espécies e, concomitantemente pela manutenção da vida, ao menos em nossa biosfera.

Porém, enquanto seres racionais, podemos conjecturar possibilidades não naturais e propor soluções artificiais em ambientes não naturais. E essa possibilidade é, para nossa espécie humana uma diferenciação evolutiva importantíssima e decisiva em nosso modo de vida.

Ao criar ambientes artificiais e soluções igualmente não naturais, o ser-humano deixa de ser um agente passivo na natureza e na escala evolutiva e passa a ser co-criador da sua realidade, como nos aponta a Bíblia Judaico-Cristã.

E assim, podemos pensar a nossa formação social de forma racional e não necessariamente natural, ou naturalista, ou de forma animalesca. Podemos, ao menos propor uma sociedade ideal.

No entanto, esta proposição esbarra nas vontades e perspectivas individuais. Indivíduos em posição hierárquica ou social superior, em geral não estão dispostos a abrir mão de seus privilégios em prol de um ideal ou algum projeto coletivo de grandes proporções.

Dessa forma cria-se a ideologia da desigualdade e se buscam argumentações, não para entendê-la e interpretá-la, mas para defendê-la contra outras proposições.



A desigualdade, como dissemos acima, é uma característica inerente do ser vivo e é provável que se perpetue, pois ela é uma característica decisiva para a perpetuação da própria existência da vida.

Todavia, defender o desigualitarismo acaba se tornando uma bandeira levantada pelas classes dominantes em razão de seus privilégios sociais e não uma análise racional da natureza que constitui nossa espécie. 

E é aí que precisamos diferenciar igualdade como meio e igualdade como fim, até para podermos traçar os parâmetros dos méritos, para podermos conceber uma suposta meritocracia. 

Não podemos considerar mérito, quando a desigualdade entre os indivíduos analisados é consideravelmente grande. 

Como exemplo do que estamos apresentando, podemos apontar uma corrida. Como podemos avaliar o mérito de dois corredores, se um começa a corrida a 100 metros da chegada, enquanto o seu concorrente começa a 1.200 metros?

É preciso haver um mínimo de equidade para podermos comparar e julgar o mérito e, quando não existe um mínimo de proporcionalidade e aproximação, a meritocracia deve ser desconsiderada.

Essa é a questão que apresentamos da igualdade como fim x igualdade como meio. A igualdade não pode ser vista como uma finalidade social, mas sim como um meio, ou mesmo um ponto de partida para que o mérito possa ser qualificado. 

Mas, com o nível de sofisticação que a nossa sociedade se apresenta, hoje, é improvável regressar a um ponto em que possamos igualar os indivíduos e permitir que partam do zero e, de forma racional e organizada demonstrem os méritos para conseguir o que precisam.

Ao longo da história, a humanidade se desenvolveu como se desenvolveu. E muito do que chamamos de injusto e desonesto está contido no arcabouço teórico do mérito material da elite constituída. Mas não há como pedir um "reset" da humanidade.

Precisamos pensar o futuro com base no presente e não num passado pressuposto, abstrato, do qual ninguém hoje vivo teve acesso ou provas.

Devemos partir da sociedade que temos e conhecemos. E essa noção de buscar aas respostas para o futuro com base no presente balizou profundamente os movimentos operários europeus dos séculos XIX e XX. 

Estes que defendiam a organização dos operários e camponeses visando a instituição de uma nova sociedade, de um novo "Estado", do ponto de vista de organização social, seja com bases na proposta anarquista, seja com a orientação "socialista utópica", seja defendendo a teoria comunista marxista. 

E para eles, é imprescindível que demos duas notícias, uma boa e uma má.

A boa é que a luta deles está perto do fim, uma vez que sempre criticaram e enfrentaram a exploração do homem pelo homem e propuseram o fim desta situação, com ideias de sociedades inovadoras, sejam extremamente igualitárias, seja comandadas pelos outrora comandados.

A má notícia é que este fim se dá não pela consecução dos objetivos originais do movimento em  utilizar a nova tecnologia em desenvolvimento para o bem comum e em prol da coletividade, mas porque o homem está cada dia mais perto de se tornar obsoleto e desnecessário. 

E é neste momento que precisamos pensar o que será de nós. 

Se as massas permaneceram existindo nos últimos 200 anos foi, não porque as elites são misericordiosas e humanistas, mas porque o operário era necessário para aumentar o lucro do industrial.

Hoje, com o advento da Inteligência Artificial, o desenvolvimento de androides e drones, a necessidade do fator humano é a cada dia diminuída. 

Se os pobres, operários e camponeses não são mais necessários, por que devem continuar existindo?

Este é o ponto de partida para o debate acerca do futuro da humanidade em um mundo cada vez mais tecnológico, no qual as funções sociais e operacionais necessitam cada vez menos do ser humano para acontecer. 

O primeiro fator a analisar é que, apesar da democratização do acesso mínimo aos avanços tecnológicos, a desigualdade social propicia uma diferença exorbitante na quantidade e qualidade da tecnologia às quais as diferentes classes sociais acessam.

E esta é a base do que vamos apreciar na continuação deste texto, na próxima semana.

Como a tecnologia pode nos levar a uma segregação ainda mais extrema a ponto de separar a raça humana em duas ou mais sub raças. Como as mitologias e religiões podem nos ajudar a compreender o momento pelo qual passamos?


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