Momento como este em que vivemos nos faz refletir sobre nós, sobre o mundo! Nesse momento, temos de nos perguntar: o que de fato vale para nós?
Vale arriscar a vida que não volta, pelo dinheiro que é passageiro, que pode-se perder em um dia e ganhar em um outro?
Vale arriscar a vida dos outros em troca de momentos de glória efêmera e retornos tão imediatos quanto voláteis?
Vemos que muitos que buscam o retorno financeiro e material do que fazem não têm um objetivo para este retorno. O material é o próprio retorno.
Vidas vazias que depositam esperanças em ídolos de luz, que desaparecem quando acaba a bateria.
É um momento interessante para se perguntar se foi mesmo melhor termos criado a sociedade para vencermos a natureza ou se criamos uma selva ainda mais violenta do que a natural, de onde saímos a milênios.
Terão razão os anarquistas que querem quebrar as máquinas?
Terão razão os contratualistas que querem acordos entre os humanos para uma vida social tranquila e produtiva?
Ou terão razão os imperialistas e fascistas que defendem o uso da foça que vença o mais forte e esta é a justiça do mundo?
Será que valerá a pena refletir sobre isso, ou é mera perda de tempo e devemos nos concentrar em acumular mais e mais?
No jornalismo, o profissional responsável pela redação de uma matéria, o redator deve responder a seis perguntas fundamentais, chamadas de Lead: o que? Quem? Quando? Onde? Como? Por que?
O filósofo, por sua vez tem uma função diferente. Ao invés de simplesmente responder ou até o inverso, contestar essas perguntas, a função do filósofo é questionar a razão das próprias perguntas.
A razão de ser e de existir de todas as coisas, materiais e imateriais são temas sobre os quais o filósofo deve se debruçar e refletir.
Para o senso comum basta que as perguntas sejam respondidas de forma razoavelmente convincente. Isso acontece até menos de forma menos racional e mais sentimental. Já para o filósofo, as respostas devem buscar o estrito racionalismo.
Seu trabalho não termina no questionamento, mas se estende pelo significado, tanto lógico, quanto moral, quanto social, quanto psicológico do que se está questionando.
Infelizmente, vivemos em uma sociedade que tem constantemente desmerecido a tarefa. Não por acaso, esta função sempre foi negligenciada pelos populares e mantida no interior dos palácios dos governantes.
Quando os filósofos se aproximam do povo, acabam se tornando ou se assemelhando a desabastados, mendigos, exilados e excluídos socialmente. Isso acontece porque o poder é muito ciumento.
É preciso por fim, definir que o filósofo não é o falido, como tenta nos fazer crer aquele jogo de tabuleiro, cujo vencedor é o milionário e o perdedor vai para o campo, viver como filósofo.
Muito menos é um jornalista frustrado que se torna astrólogo e depois de décadas de inutilidade se torna um agitador político anticientífico e terraplanista.
Ao contrário, o filósofo não é o contestador da ciência, mas seu precursor. Só existe ciência hoje, porque no passado, os jônicos resolveram fazer filosofia. Assim, afastaram o pensamento do mito e da magia e proporcionaram a todos os que têm vontade a aprender como o mundo natural funciona.
John Stuart Mill, considerado por alguns como o pai do liberalismo e que era utilitarista que defende o limite do poder que pode ser exercido legitimamente pela sociedade sobre o indivíduo?
Ou seria Karl Marx que defende o oposto e, para ele, o indivíduo estaria livre a medida que a sociedade se impusesse sobre todos os indivíduos de maneira comum?
É difícil fazer tal julgamento, pois se há alguns mais livres que outros estes outros terão de fato alguma liberdade, ou serão prisioneiros das vontades dos que são verdadeiramente livres?
De outro modo, se a sociedade se impõe ao indivíduo e lhe priva de qualquer tipo de liberdade haveria a possibilidade de se entender que estes indivíduos estariam de fato livres de forma absolutamente idêntica? Haveria sequer a possibilidade se haver realmente uma determinação que tornasse exatamente igualitária as relações de todos os indivíduos com a sua sociedade?
O fato é que os radicalismos nunca se provaram práticos e eficientes como se propunham. Ao mesmo tempo que sociedades democráticas se mostram muito "simpáticas" ao autoritarismo sazonal, as sociedades ditas igualitárias sempre ostentaram poder centralizado e hierarquias rígidas.
O que fica para a história é a clássica máxima que afirma: "falar é fácil"!
Entre os anos 540 e 470 a.C., na região de Éfeso, uma pólis grega que fica onde hoje é território da Turquia, circulava um sábio enigmático e complexo. Se nome era Heráclito e ele acreditava que a natureza estava em constante transformação.
Este filósofo ficou famoso pela máxima "Panta Rei", que significa de forma simplificada que tudo flui, tudo se move. Dessa forma a natureza é classificada pelo eterno Devir, ou seja tudo se torna outra coisa, tudo se transforma. Como diria o verso daquela canção, "tudo muda o tempo todo, no mundo"*.
Heráclito de Éfeso é considerado o pai da dialética e foi chamado de " o obscuro", devido à dificuldade de entender suas teorias, inclusive por outros filósofos.
Para o filósofo de Éfeso tudo era movimento. Tudo se move, exceto o movimento. E
o "devir" que está presente em todas as coisas e é recorrente trata-se de uma alternância entre os contrários, como o quente que esfria, o seco que se molha e vice-versa.
Assim o pensador conclui que há uma harmonia nessa relação entre opostos, o que se configura como um ciclo que se repete.
Sua passagem mais célebre é o aforismo do rio, no qual o pensador compara tudo às águas de um rio. Tudo flui, como as águas de um rio. E daí formulou o conceito:
"Não se pode percorrer duas vezes o mesmo rio e não se pode tocar duas vezes uma substância mortal no mesmo estado; por causa da impetuosidade e da velocidade da mutação, esta se dispersa e se recolhe, vem e vai."
— Diels-Kranz: Os fragmentos dos pré-socráticos, 91
Heráclito foi um pré-socrático da escola jônica. Como tal aderiu à formulação de um elemento primordial. Para a função, ele escolheu o fogo.
O filósofo de Éfeso também tratou da cosmologia, com base na sua crença de que o fogo gerara todas as outras coisas. Além disso, também propôs um conceito de divino no qual Deus seria não um ser criador e onipotente, mas sim a composição de opostos, como o dia e a noite, a guerra e a paz, etc.
É mais conhecido pela contraposição com a filosofia de Parmênides. Este considerara a unidade e o imobilismo do ser, uno, eterno e imutável. Esta fora uma das grandes celeumas da história da filosofia ocidental.
Heráclito era um homem sábio e inteligente, porém excessivamente arrogante e antissocial. Conta-se que, em seu tempo, teria se desentendido com os médicos de sua cidade.
Em dado momento se retirou da vida social e foi viver isolado em uma montanha.
Aconteceu que ficou doente e decidiu voltar para se tratar. Alguns historiadores acreditam que se trata-se de um edema.
Como não confiava em médicos, consultou um curandeiro das proximidades, que recomendou que ele se cobrisse com esterco, o que acredita-se que tenha feito.
Não se sabe ao certo o que aconteceu, mas após isso o filósofo acabou falecendo. Uns apontam que teria se sufocado no estrume, enquanto outros acreditam que tenha sido devorado por cães famintos. Outros apontam ainda que teria morrido naturalmente em decorrência da sua doença.
O fato é que Heráclito foi um pensador muito influente e é referência ainda hoje, mais de dois séculos após a sua morte!
Muito provavelmente você já ouviu alguém proferir essa frase. Mas será que a pessoa sabia de fato o que estava falando?
A menos que se tratasse de um anarquista antissocial, provavelmente ela estava enganada. A política nada mais é do que a ciência que estuda e pratica organização, direção e administração de uma sociedade.
A própria vida social é uma forma de política, a partir do momento em que todas as suas relações sociais interferem em maior ou menor grau na vida das demais pessoas que fazem parte daquele meio.
O filósofo grego Aristóteles classificou o ser humano como "politikon zoon" , ou melhor um "animal político". A vida social é uma das características mais marcantes da humanidade em sua existência na Terra.
A espécie humana prosperou no planeta muito em função da sua capacidade organizativa e do uso da coletividade associado à divisão de tarefas.
Como cada indivíduo tem características diferentes e suas próprias preferências e aptidões peculiares, os trabalhos acabaram sendo divididos conforme essas tendências.
É muito pouco provável que indivíduos tenham sido autossuficientes o bastante para se perpetuarem na Terra, espalharem seus genes vivendo em absoluta solidão. Se o fizeram, em algum tempo, acabaram sobrepujados pelos que viviam em sociedade e não puderam gerar descendentes. A força do número não pode ser ignorada.
Iniciar um relacionamento amoroso é parte da política também. É preciso ser político para convencer a outra pessoa que ela deve abrir mão de todos os outros indivíduos para ficar exclusivamente contigo.
Da mesma maneira, é preciso convencer a todos os outros de que aquela pessoa está exclusivamente contigo. A menos que vocês tenham aderido a uma proposta mais aberta, ou tenham simpatia com ruminantes.
Mas da ida ao supermercado até o estudo dos astros, tudo tem política envolvida.
Não confunda o conceito pleno de política com o de eleição. É aí que muita gente se confunde. Obviamente, as eleições em um Estado organizado na forma de governo representativo é a expressão máxima da política civil.
Mas todas as etapas entre sua casa e a urna são influenciadas por decisões políticas, ou seja organizacionais e sociais, desde o café da manhã que você toma, passando pelo meio de transporte utilizado (coletivo ou individual) e até a urna utilizada, seja a manual, seja a eletrônica.
Se você continua afirmando que odeia política, sugiro uma heráclita retirada para as montanhas. Só lembrando que o sábio filósofo grego, Heráclito o fez e não acabou muito bem.
Na próxima semana, vamos contar a história dele e como ele morreu literalmente na ...
Quando um candidato a um cargo público se apresenta para pedir votos, as pessoas podem se referir a ele como "de esquerda", "de direita" ou "de centro", ou mesmo como um intermediário entre estes. Mas de onde vem essa terminologia?
A dicotomia é relativa ao momento e não é constante no espectro político.
Em geral as ideologias políticas são enquadradas dentro de uma linha conhecida como "espectro político" que tem como função classificar e caracterizar os diversos pensamentos políticos em relação aos outros.
Originalmente se via a política em uma linha reta bidimensional, ou seja, com um centro e de um lado a esquerda e de outro a direita como visões diametralmente opostas.
A maioria dos historiadores apontam a Revolução Francesa como o momento da história em que essaa referência do espectro se popularizou, embora algumas vertentes de pensamento indiquem que essa nomenclatura já era usada bem antes, como na Idade Moderna.
Algumas lendas relatam que os termos teriam surgido em relação ao Rei, no Antigo Regime que dominou a Europa, no período pós medieval. Os aliados do rei ficariam a sua direita, enquanto seus opositores se posicionariam à esquerda.
Durante muitos séculos, a lógica foi essa e se identificava a direita como conservadores ou reacionários e sempre em alinhamento com a monarquia e o tradicionalismo, ou mesmo ao retorno à moral monárquica ou imperial.
Já a esquerda ficaria entre os revolucionários organizados (como comunistas) reformadores (liberais e socialistas) e libertários extremos (anarquistas).
Entretanto, cientistas políticos contemporâneos avaliam a existência de pensamentos e tendências intermediárias tão diferentes entre si e tão equidistantes dos extremos que esse espectro não pode, ou não deveria ser entendido como linear.
Análises "geométricas" considerando um espectro político plano ou até esférico vem sendo muito mais utilizadas na contemporaneidade.
Os próprios conceitos sobre autoritarismo e libertarismo são relativizados e podem ser entendidos como "de esquerda" ou "de direita".
Hoje, muitos modelos são utilizados para classificar um pensamento ou ideologia política e, ao que parece nenhum parece definitivo, dado que a cada dia outras visões e outras formas de pensar o mundo surgem das mentes mais brilhantes... e dos memes também!
Uma das discussões mais comuns travadas em redes sociais na última década foi sobre de qual lado do espectro político, o nazismo e o fascismo estaria.
Para entender a alocação política do nazismo, precisamos primeiro entender as suas origens e preceitos. Primeiro temos que entender que o nazismo é uma subdivisão do Fascismo, uma ideologia política ultranacionalista e autoritarista, que se caracteriza pelo poder ditatorial e centralizador, pela repressão violenta de opositores e pelo forte controle social e da economia.
O Fascismo se opôs fortemente ao liberalismo e ao comunismo, ao mesmo tempo que não era favorável ao conservadorismo, embora alianças com setores da direita tradicional tenham sido vistas.
Esta ideologia política aceitava os avanços tecnológicos positivos e científicos, mas propunha a emergência de uma nova classe dominante, baseada na força.
Já o nazismo é uma forma de fascismo que acrescenta o antissemitismo e o "racismo científico" como doutrina base.
Sua argumentação se baseava na crença de que o povo germânico pertencia a uma raça mais elevada de seres humanos, a chamada Raça Ariana.
Sua origem remonta a derrota da Alemanha na primeira guerra mundial e foi influenciada pelos Freikorps, grupos paramilitares que surgiram após o mega evento.
O nazismo apoiava a noção pseudo-científica da hierarquia racial e do darwinismo social. É comumente referida como o nacional-socialismo pois pretendia se diferenciar radicalmente tanto do capitalismo de livre mercado, quanto do comunismo marxista.
É nesse ponto que reside a dúvida que cria toda a confusão.
Apesar de se denominar socialismo, é um doutrina nacionalista radical.
Dessa forma não pode ser vista como associada ao conceito de esquerda, que temos hoje, visto que esta é uma ideia associada ao liberalismo libertário, que defendia exatamente seu inverso: a liberdade individual.
O erro analítico associado ao termo nasce ao tentar se ver a história de trás para frente. Quem analisa a forma de atuação e governo dos nazistas os associa ao modus operandi soviético.
Isso é perceptível.
Entretanto, é preciso primeiro entender o que foi caracterizado como esquerda, quando este termo se tornou emblemático para tratar da política, entre os séculos XVIII e XIX.
Por seguinte, devemos entender a busca do governo soviético em influenciar partidos de oposição e esquerda do mundo ocidental, principalmente do chamado "Terceiro Mundo".
Depois, temos que entender como funciona o jogo político da nossa sociedade, na qual as ideias de economia e sociedade se confundem.
Nesse contexto surge a figura do conservador nos costumes e liberal na economia, que nada mais é do que uma ideologia dos grandes possuidores de capital que guardam publicamente valores tradicionais (ainda que na vida privada façam completamente diferente) visando agradar a opinião pública, principalmente dialogar com os mais pobres, que em geral, tem mais apreço ao conservadorismo social.
Entretanto, no aspecto econômico propõem menos intervenção do Estado, o que não acontece por moral, ou por crença filosófica, mas apenas na tentativa de pagar menos tributos e aumentar suas margens de lucro.
Assim, na política econômica reformista da esquerda, as ideias keynesiana (de John Maynard Keynes, economista britânico que defendeu a intervenção do Estado na economia para salvar o capitalismo) se coloca como a ideologia econômica que predomina entre os setores da esquerda.
Apesar de se colocar como defensora do comunismo marxista, em razão da influência soviética do século XX, a esquerda é na verdade uma versão moderada do liberalismo libertário, com forte tendência reformista, com pouca inclinação revolucionária.
Considerando estes fatores, o nazismo e o fascismo são facilmente entendidos como teorias de direita. Mas uma direita menos conservadora e mais progressista, no quesito técnico e muito mais reacionária, na questão social, nacional e étnica.