sexta-feira, 1 de outubro de 2021

A Nova Caverna

Encerrados em seus próprios mundos e escravizados pela tecnologia, cada ser humano do século XXI vive,  a sua própria realidade. 



A verdade não se encontra na experiência ou no raciocínio, mas no pronunciamento da celebridade favorita, em sua rede social. 

As palavras, geralmente vazias, do artista, músico, político, modelo, ou atleta favorito torna-se verdade, sem julgo, sem crítica, sem a menor tentativa de experimentação. 

Se pensamos que um remédio vai tratar certa doença, não há estudo ou prática laboral que demova o ser humano de sua crença. 

Vivemos um mundo em que dogmas são impostos e raramente discutidos, em todos os âmbitos. 

O ser humano hoje vive encarcerado em sua caverna, vendo as sombras da vida, acreditando que estas são as coisas reais e não a suas impressões. 

O mito da caverna é uma passagem do livro "A República", escrito por Platão e que tem Sócrates, como personagem principal. 

Este conceito é apresentado por Platão, que se refere a um grupo de homens presos no interior de um caverna. Eles estão sempre de costas para a saída e há um muro entre eles e o mundo exterior. Do lado de fora, algumas pessoas passam com figuras e as sombras desses objetos aparece na parede interior da caverna. 

Os homens ali acorrentados observam as sombras e as tratam como se fossem os próprios objetos reais. Dessa forma, ele entendem como o mundo real o mundo das sombras que aparece no interior da caverna. 

Até que um deles se solta e descobre o que há no mundo exterior, o que há na realidade. Ele volta e tenta libertar os demais, mas Sócrates e Glauco (seu interlocutor no diálogo) acreditam que este seria punido severamente, ou considerado insano, pelos prisioneiros que não conheciam a luz. 

Esta passagem introduz ao dualismo platônico, que é representado pela dicotomia entre a luz e a sombra, entre o mundo sensível e o mundo das ideias, que seria o mundo pleno. 

Ela também mostra a importância do filósofo como aquele que busca o conhecimento verdadeiro e tem a possibilidade de apresentá-lo à sociedade. Entretanto também aponta a possibilidade deste não ser bem recebido pela sociedade. 



Hoje, nossas cavernas são nossos celulares, tablets, notebooks, computadores. Vemos por meio destes, em nossas redes sociais um mundo de sombras e fingimentos e acreditamos neste como uma realidade de fatos. 

Será possível que consigamos nos livrar dessas amarras e buscarmos a luz? 

Será que queremos?


Araújo Neto

sexta-feira, 24 de setembro de 2021

A Utopia - Thomas Morus

Thomas Morus era um cara diferente. Além de pensador e filósofo foi um estadista, advogado e legislador, que entre 1529 e 1532 ocupou o cargo de Lard Chancellor (Chanceler do Reino) durante o Reinado do polêmico monarca Henrique VIII.




Em 1516, Morus escreveu e publicou sua obra prima: A Utopia. O termo foi uma criação do próprio Thomas, que uniu os termos "Ou" que indica negação , "Topus" , que dá ideia de lugar e "ía", que é qualidade de um Estado. 

Utopia então significaria algo como "Em lugar Nenhum" e foi o título do livro no qual o escritor descreveu um lugar maravilhoso, paradisíaco no Novo Mundo recém descoberto, onde as pessoas viviam felizes e tinham completo desapego material. 

Nele, o soberano Utopus organizava a sociedade a fim de que todos dividissem seus bens materiais ao ponto em que não sobrasse nem faltasse nada de básico para os cidadãos daquele fantasioso reino.

Na época da conquista da América, pelos europeus, muitos relatos de cidades fantásticas e esplendorosas corriam o Velho Continente, como o "Eldorado" e mesmo a possível descoberta da Atlântida! Utopia entra nesse contexto sendo um relato conscientemente fictício que serviu como uma veemente crítica da sociedade europeia daquele tempo e o domínio do ouro.

Não é difícil se entender porque Morus foi decapitado a mando do próprio Rei Henrique VIII.



Além de sua defesa de um comunismo humanista e idealista, que se tornou referência para as classificações que seguiram às revolução liberais, Morus ainda se manteve fortemente ligado ao catolicismo, mesmo após a Reforma Anglicana, promovida pelo rei, que o mandou decapitar. 

A Utopia se tornou uma referência muito controversa na literatura política e utópico se tornou um adjetivo muito comum, quando os poderosos rejeitam qualquer teoria que conteste seus poderes.

Araújo Neto

sexta-feira, 17 de setembro de 2021

O Príncipe - Nicolau Maquiavel

Nada de romantismo e nem de ideologia. O livro que abordamos hoje traz essencialmente fundamentos das relações políticas entre as pessoas em sociedade e, principalmente, entre governantes e governados. 



"O Príncipe" foi a obra máxima do escritor italiano Nicolau Maquiavel. O autor dedicou seu escrito a Lourenço II de Médici, Duque de Urbino. 

Para alguns historiadores, Maquiavel seria um republicano, que via no ducado uma solução para a unificação da Itália, que só aconteceria de fato três séculos depois.

Neste tratado, o autor tenta demonstrar a natureza do relacionamento político apontando os meios como  o governante pode manter a sociedade em paz e prosperidade, sendo ao mesmo tempo amado e temido pelo povo. 

Porém, não se pode dizer que seja uma defesa do absolutismo crescente, na época em que fora escrito, em 1513. Ao contrário, o próprio escritor aponta que ao mesmo tempo em que em sina o soberano a governar, busca mostrar o caminho para o povo saber cobrá-lo. 

Este livro é considerado por muitos cientistas políticos, sociólogos, historiadores e filósofos como uma das mais completas e bem estruturadas teorias políticas da historia, sendo um dos primeiros da Europa pós-medieval.

A obra também é vista com um olhar um tanto tendencioso. Após sua publicação, o termo "maquiavélico" acaba sendo incorporado ao linguajar cotidiano, sendo associado à maldade, ao ardil, ao interesseiro, em virtude da clássica frase contida nele que diz "os fins justificam os meios". 

No entanto, Maquiavel defende uma visão material e objetiva e, pela afirmação defende que o monarca deve buscar de todas as formas para manter sua autoridade e essa visão tem como base as relações complicadas que existiam na região italiano, no início do século XVI.

Apesar de ser seu  maior trabalho, Maquiavel não colheu os frutos do seu sucesso. "O Príncipe" foi publicado postumamente, ou seja, após a morte de seu autor. 





Araújo Neto

sexta-feira, 10 de setembro de 2021

"Assim Falou Zaratrusta: Um Livro Para Todos e Para Ninguém"

Friedrich Wilhelm Nietzsche era um filósofo alemão nascido em 15 de outubro de 1844, no reino da Prússia. Vindo de família de pastores luteranos, Nietsche chegou a cogitar a seguir a carreira pastoral, mas mudou de ideia na adolescência. 




Sua visão crítica da realidade o levou a questionar a moral e a religião tradicional, assim como o senso comum e as tradições culturais. 

O livro retrata de forma poética e com base ficcional as andanças de Zaratrusta, um filósofo e profeta que assim se autonomeou após a fundação do zoroastrismo, na antiga Pérsia. 

O cerne das questões levantadas pelo escrito focam na noção que a humanidade é um estágio intermediário entre macacos evoluídos e o que Nietzsche vem chamar de "Übermensch", o Super Homem. 

Para alcançar tal estágio, o ser humano deveria evoluir abdicando de conceitos que serviriam de prisão para ele, como a moral, a religião etc. 

O livro é extremamente complexo e de difícil entendimento. Talvez duas ou três leituras não sejam o suficiente para capitar e entender todas as questões levantadas pelo autor. 

Além disso, o texto é absolutamente polêmico, evocando pontos como a "morte de Deus" e o "eterno retorno do mesmo", máxima que afirma que  sua vida é como é, mesmo que fosse para sempre, iria se repetir.

Apesar da complexidade, "Assim Falou Zaratrusta: Um Livro Para Todos e Para Ninguém" é essencial para quem quer entender sobre filosofia, sua história e suas implicações na contemporaneidade. 





Araújo Neto

sexta-feira, 3 de setembro de 2021

O Contrato Social

Se hoje vemos celeumas irreconciliáveis entre socialistas e liberais econômicos essa não foi a tônica quando essas doutrinas surgiram na Europa, no final do século XVIII. Nessa época, todos os que tinham visões contra o regime político-econômico vigente, o chamado "Acien Régime"*, eram agrupados nas fileiras do liberalismo. 


Jean-Jacques Rousseau - Wikipedia



Essa nova orientação político-social de cunho burguês tinha como objetivo trazer à sociedade europeia daquela época um conjunto de novos direitos que envolviam liberdade individual e econômica, além de avanços produtivos criando assim uma sociedade bem diferente da que existia até então. 



Esse conjunto de preceitos fomentou a consolidação da sociedade liberal-burguesa, no Ocidente e trouxe consigo, além das questões políticas outas visões em diversas áreas do saber, como a ciência e a arte. Um dos seus resultados foi a ampliação da Revolução Industrial, originada na Inglaterra, para toda a Europa e além. 

Na literatura e nas artes foi base para o desenvolvimento do romantismo, uma corrente literária caracterizada pela idealização e pelo sentimento, em contraponto ao industrialismo material da ciência, que mais tarde vai gerar o surgimento das correntes realistas.

E é nesse contexto do afloramento do romantismo que Jean-Jacques Rousseau dá a partida para seus escritos. O mais célebre deles é exatamente este livro: "Do Contrato Social " (ou "O Contrato Social"), obra pela qual o autor ficou historicamente conhecido. 

Rousseau fora um romântico liberal, ainda que com uma forte inclinação naturalista e igualitarista, além de admitir uma grande tendência espiritualista, a qual o fez criar desavenças com outro célebre filósofo francês, Voltaire.

No Contrato Social, Rousseau expõe suas visões sobre a origem do ser humano e da sociedade e como esta tem efeito nocivo na moral e no espírito natural daquele, correndo sua mente e seu coração. Para abrir mão da sua liberdade natural em troca da segurança da sociedade, o autor defende que o indivíduo deveria ter garantido o direito à liberdade civil, garantido exatamente pelo "Contrato Social". 

Este contrato seria uma espécie de mecanismo pelo qual o povo deveria ser agente ativo da relação com o governo desta sociedade, ao mesmo tempo em que deveria obedecer às leis proporcionando a mesma liberdade aos demais indivíduos componentes do agrupamento social. O Estado em si, apesar da importância não seria o soberano, mas suas ações deveriam se dar em nome da liberdade do seu povo.

Um dos enunciados mais repetidos propostos pelo filósofo francês foi a máxima de que o "homem nasce bom e a sociedade" o corrompe. Para ele, as instituições sociais eram o que de pior. No estado de natureza, ou seja, antes do surgimento da sociedade, haveria harmonia e abundância para o homem, pelo fato de ter igualdade e liberdade, além da coletividade ser uma constante que inclinava o indivíduo à busca do bem comum. 

Para ele, a propriedade privada e desigualmente distribuída era o princípio pelo qual se caracterizava a corrupção da coletividade. No "Contrato Social", Rousseau afirmou que:


"O homem nasceu livre e, em toda parte vive acorrentado. O que se crê amo dos outros não deixa de ser mais escravo que eles"! 



E este é o princípio que define não só este livro, mas toda a filosofia de Rousseau, uma busca pela liberdade, pelo felicidade coletiva e pela justiça social, deste que é um filósofo contratualista e liberal no sentido máximo, que influenciou revoluções burguesas que se seguiram ao seu período, além das doutrinas liberais, socialistas e anarquistas. 

Certamente é um dos livros mais importantes sobre política e filosofia da modernidade e ajuda a explicar boa parte das visões políticas mais marcantes dos acontecimentos históricos do final do século XVIII e do início do século XIX, antes que a dialética comunismo x capitalismo dominasse o discurso político ocidental. 


Araújo Neto (2021)


* Termo em francês que significa Antigo Regime

sábado, 14 de agosto de 2021

Técnica x popularidade

O que importa mais: ser profundamente bom ou ser amplamente popular?



Quando tratamos de um produto, de um objeto, de uma máquina ou de um serviço, a qualidade técnica é facilmente definida. Se um produto funciona como ele se propõe a funcionar e acima da média de seus similares, assim como se tem uma durabilidade alta dizemos que ele tem qualidade.

Entretanto, quando analisamos indivíduos e ações humanas esse conceito se torna amplamente relativo. Vemos músicas, livros, até mesmo profissionais que podem ser muito populares, mas que não apresentam a chamada qualidade técnica que muitas vezes é vista em obras e pessoas menos requisitadas. 

Quem apresenta mais qualidade, um pianista clássico que estudou por anos horas e horas o seu instrumento e que faz uma obra afinada e com uma produção sofisticada, mas que tem menos que uma centena de ouvistes ou um artista popular que faz uma produção quase caseira, desafinada e simplória, mas que que tem centenas de milhares de apreciadoras?

Será que importa mais ser tecnicamente ou bom ou ser popularmente reconhecido? 

Muitas vezes, em se tratando de questões humanas o que entendemos como bom, pode simplesmente não agradar o público, seja pelo momento social vivido, seja pela falta de compreensão do projeto, por parte das pessoas no meio ao qual ele é exposto. 

Será que Mozart e Chopin teriam alguma relevância no meio artístico atual? Será que Michael Jackson e Lady Gaga teriam sido conhecidos, antes do advento da música comercial?

Para ser popular é preciso atender às expectativas do público geral, para o qual a obra será direcionada, assim como ser facilmente assimilável e conter uma grande quantidade de elementos que sejam familiares aos receptores. Novidades devem ser inseridas com cautela. 

Já para ser tecnicamente bom é preciso muitas e muitas horas de estudo, prática e aperfeiçoamento. O curioso é que, nos tempos atuais, esta função exige mais investimento em tempo que a primeira, mas o retorno financeiro é altamente questionável.


sexta-feira, 6 de agosto de 2021

Filosofia e Esportes: Olimpíadas na Antiguidade.

O que tem a ver filosofia e esportes? Filósofo pratica esportes? Qual filósofo participou das Olimpíadas na antiguidade?



Quem acha que filósofos são "nerds" meio lesados, com dificuldades para esportes está enganado. Ao menos se estamos falando de filósofos gregos. 

Ao contrário do que os estereótipos atuais possam sugerir, os filósofos de Grécia Antiga costumavam-se a dedicar a muitas disciplinas e, por essa razão foram considerados homens universais.

Aristóteles, Sócrates e Platão, por exemplo, foram relatados como expectadores dos jogos olímpicos em algumas oportunidades. 

Platão foi além. Apesar da sua filosofia contemplativa, sua prática foi muito mais incisiva do que aparentaria. 

O filósofo inclusive participou dos jogos como competidor e teria sido bicampeão olímpico no pancrácio, um espécie de luta misturada com pugilato (quase um boxe), um "vale-tudo" da época. 

Outro que pode ter participado dos Jogos foi Pitágoras. Pode, porque até hoje não se sabe ao certo se foi mesmo o matemático de Samos, que chegou a ser proibido de competir no pugilato, o boxe da época, mas foi proibido de competir entre os meninos por ter sido considerado "efeminado". No entanto, competiu entre os homens e ganhou de todos os adversários. 

Segundo o clássico historiador e biógrafo dos filósofos gregos, Diógenes Laércio, não se tratavam da mesma pessoa, embora alguns autores contemporâneos discutam essa identidade. 

Aliás, hoje os especialistas em educação já admitem que há uma relação direta entre a prática de esportes e o desenvolvimento intelectual. Quem pratica esportes na escola aprende mais facilmente. 

Portanto, tenha cuidado! Não ache que aquele fortão que puxa ferro na academia tem a cabeça vazia. Muito filósofos também foram atletas. Filósofo também pratica esportes.




Araújo Neto